quarta-feira, abril 11, 2012

Videodrome (David Cronenberg, 1983)




O crítico R. Barton Palmer levanta uma hipótese interessante quando coloca que "a história de David Cronenberg sobre as horríveis transformações geradas pela exposição à violência televisionada, aborda habilmente os problemas que o próprio diretor havia tido com censores, distribuidores de Hollywood e grupos feministas por conta da exploração de imagens de violência sexual em suas produções anteriores." Essa livre interpretação do filme enriquece a sua análise, uma vez que aproxima o seu idealizador do seu objeto de estudo.

Na verdade, Videodrome é o primeiro filme em que as obsessões e o estilo que fizeram a fama de Cronenberg se manifestam em toda a sua plenitude. Não fosse a mente perturbada do diretor canadense (peço licença pra me servir do cliché comumente associado à figura do cineasta) o filme não passaria de um noir ordinário: um produtor de TV inescrupuloso (James Woods) se dá conta, por meio de uma inspiradíssima femme fatale (Deborah Harry), de que não passa de um intermediário em um complexo esquema severo de manipulação de mentes e desejos - o matrix de Cronenberg quase vinte anos antes do Matrix (1999) dos irmãos Wachowski, bem menos estilizado e muito mais interessante.

A ideia (recorrente em cinema) do protagonista que se apaixona por uma imagem (não necessariamente pelo objeto) é levada ao extremo em Videodrome. O filme aborda, dentre outras coisas, a vertente nefasta da relação homem x imagem (no caso a TV, mais precisamente o vídeo - lembremos que o filme é do início dos anos 80). É impossível prever nos primeiros minutos de projeção que o filme nos conduzirá às mais recônditas e bizarras manifestações do subconsciente - dos deles (o diretor e seu protagonista) e do nosso. Os eventos se sucedem naturalmente, em um ritmo vagaroso, contrastando com a extravagância das questões que emergem na tela. A opção acertadíssima de evitar um cenário futurista, ou retrô carregado, ou qualquer alternativa que nos afaste da "nossa realidade", contribui para o efeito de estranhamento que a trama nos proporciona. Eu gosto particularmente da maneira como o filme nos envolve sem chamar a atenção para a sua excentricidade.

A filmografia de Cronenberg é repleta de referências ao sexo (o ato sexual e a sexualidade) e a violência, bem como aos efeitos dessa combinação. Dada a natureza instintiva de ambos, não espanta que seus personagens se comportem, por vezes, como animais selvagens. A Mosca (1986) é a metáfora perfeita dessa condição. No entanto, a imagem que melhor ilustra essa combinação em toda a filmografia de Cronenberg se encontra em Videodrome: a pistola na mão de James Woods (representando seu pênis) com o cano a acariciar o “inexplicável” orifício (remetendo a uma vagina) formado em sua barriga.

É um cinema de vícios e que vicia. Sem contra indicações.


4 comentários:

  1. Respostas
    1. Eu fiquei tão viciado que assisti mais 3 Cronenbergs na sequência. É, sem dúvida, um dos seus melhores filmes.

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    2. Então, mostre-se altruísta em sua benevolência, e indique-me um segundo Cronenberg! Acabei de ver Videodrome e confesso que estou impressionado com a perspicácia da obra, porém ainda perdido no meio de tantas outras. Vou de "A Mosca" ?

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  2. Rimo, obrigado pela visita! Como já dizia Roger Ebert "I envy you the experience you are about to have". Qualquer Cronenberg é válido, penso que talvez você potencialize a experiência caso você consiga assisti-los em ordem cronológica. Isso não é uma obrigação, eu mesmo não entrei em contato com a obra de Cronenberg dessa forma. "A Mosca" está tão fácil, passando no Netflix agora... aproveita a disponibilidade. Dois outros que se assemelham são "Mistérios e Paixões" e "eXistenZ". Depois passa por aqui e me conta a experiência! Boas sessões!!!

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